Porto, 10 de Outubro de 2024
Leitura de um soneto de Antero de Quental. Deixei-me ficar quieto, aguardando que o poema começasse a fazer efeito. Reli, parei, voltei a ler. E depois, já devidamente dopado, aconteceu algo de extraordinário. Deixei de querer tentar escrever...
XII.
A José Felix dos Santos
Sempre o futuro, sempre! e o presente
Nunca! Que seja esta hora em que se existe
De incerteza e de dor sempre a mais triste,
E só farte o desejo um bem ausente!
Ai! que importa o futuro, se inclemente
Essa hora, em que a esperança nos consiste,
Chega... é presente... e só á dor assiste?...
Assim, qual é a esperança que não mente?
Desventura ou delirio?... O que procuro,
Se me foge, é miragem enganosa,
Se me espera, peor, espectro impuro...
Assim a vida passa vagarosa:
O presente, a aspirar sempre ao futuro:
O futuro, uma sombra mentirosa.
(In Sonetos de Anthero, Coimbra, 1861, n.º XII. Disponível aqui.)
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Créditos Fotográficos: Banco em Ponta Delgada, no Campo de S. Francisco, onde Antero suicidou-se em 1891. Disponível aqui.